terça-feira, 9 de abril de 2013

Eu, Mme Deprê e o Por que..?


Não, não me pergunte "por que você está assim?". Esta é a pior pergunta que um deprimido pode ouvir. Eu não sei explicar. Só sei que é uma tristeza profunda e um vazio que me bate à porta e me remete a um lugar de dor onde eu não queria estar. Não há hora e tempo determinados para surgir e chegar, como também não há hora e tempo determinados para me deixar e ir embora. Não é constante; é tempos sim e tempos não, horas sim e horas não. Também varia de intensidade; às vezes doi mais, às vezes doi menos. Não tenho controle. 


Num momento ou dia qualquer, de repente, surge uma sombra e esta sombra transforma tudo em tristeza, provoca dor, sensação de inadequação, desejo de fugir de mim e de tudo, ir pra não sei onde. Dormir é difícil, acordar é amedrontador, trabalhar é tedioso, tudo se transforma num insuportável-igual-sem graça-tudo fuga, fuga do nada que leva a lugar nenhum. Machuca o peito, endurece a alma, desafia a euforia, empurra pra baixo, derruba, põe no chão, degringola, decreta a tristeza, o desespero e o desencanto.



Tenho a sensação de que num momento qualquer que eu não sei, algo ou alguém me tirou um pedaço. E a falta deste pedaço provoca o incômodo-ruim que me faz desejar o ir pra não sei onde e fazer exatamente não sei o quê porque eu não queria estar ali e também não queria estar lá e nem em lugar nenhum e não ser nada e inexistir. Ser eu mesmo, algo do que me orgulho algumas vezes, de repente se transforma num erro absurdo, digno de uma borracha que me apague pra sempre, para nunca mais lembrar, pra nunca mais ter sido. Nestes dias eu choro e choro e choro e fico de olhos nublados impedido pelas lágrimas de ver o sol e mar que tanto amo. 



Ainda assim, chorar tem sido o meu socorro. Sem a capacidade de chorar, seria impossível viver o vazio que ocupa todos os espaços. Chorar tem servido de socorro porque num choro quaquer, num dia qualquer, também indefinido e sem momento determinado pra chegar, o choro vai levando o vazio para um lugar que é não sei onde e sem explicação. Também sem explicação, lágrimas outrora turvas de repente parecem ir lavando e limpando a alma, fazendo retornar um hálito tênue de vida, devolvendo um pouco da respiração perdida. E como se se cumprisse a palavra-profecia do sábio: "o choro pode durar uma noite, mas a alegria vem ao amanhecer", vou amanhecendo.



Amanhece e depois do choro vem aquele cansaço providência divina. Deito-me, fecho os olhos, cabeça sobre o travesseiro, respiro fundo e profundo e fico ali revirando memórias, procurando imagens. O sono perdido aos poucos retorna, a hora passa, o corpo descansa, os olhos enxugam e mais tarde acordo melhor quando abro os olhos e já com um quase outro olhar, pela janela já quase consigo ver o mar e o sol que tanto amo.



Embora ao redor tudo esteja o mesmo, tudo já não é mais o mesmo, eu já não mais o sou. Por dentro parece ter sido acesa uma chama, ainda fraquinha, que vai resistindo ao vento, titubeando, brilhando, me tirando aos poucos do escuro e me fazendo renascer um tantinho de vida. Levanto-me, saio do ninho, procuro algo pra fazer ganho as calçadas, a rua, o mar e mundo sob o sol e sobre o meu alívio.



Apresento-lhes, para terminar, madame deprê: atriz impetuosa e cheia dos direitos que decide hora e dia de atuação e e hora e dia de bastidores. Quando está no palco, me joga na cara uma pá de tristeza e me se enterra encostado ao muro. Quando decide recolher-se a minha alegria toma conta e tudo vale a pena. Impetuosa, esta tinha medonha não me deixa e não se vai, não me deixa e nem se morre, apropria-se e se estabelece ao seu bel prazer e se deleita na dor quando bem o quer. Livrar-me dela, apesar de muita luta, não sei.  



Livra-me dela não sei porque se  esta tinha tivesse corpo e cara ou se eu soubesse o porquê ou onde é se esconde, eu já lhe teria enfiado a faca e a estaca e extirpado do peito, do corpo e da alma. Ocorre que não sei, repito. Se é biológico, patológico, lógico ou ilógico, também não sei. Recorrer aos arquétipos, infância, adolescência, juventude, meia idade, seja lá o que for, não oferece resposta e eu também não sei. De alguma forma e em alguma proporção, todos encaram a tal madame, mas isso também não me oferece resposta satisfatória e outra vez, eu não sei.



Portanto, não me pergunte: "por que você está assim?" 



Não há resposta, nenhuma resposta cabe nesta pergunta, enfim. 



Sente-se. Sofre-se. Agoniza-se. Chora-se. Lamenta-se. Entristece-se. Alegra-se. E fim. 



Assim. Tem sido assim!





















3 comentários:

  1. Assim. É mesmo assim.

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  2. Amigo querido!
    Acho que essas inquietações mobilizam todo aquele que se permite sentir. Sentir profundamente o mundo externo e interno. Não apenas passar pela vida, mas deixar que a vida passe por dentro de si, deixá-la "correr nas veias".
    Com isso ficamos mais suscetíveis, mais frágeis às mudanças do mundo - somos mundo!
    Que bom que você é corajoso e me permite "entrar" no seu mundo. Que bom tê-lo, cada vez mais, no meu mundo!
    Quanto à luz, sempre entrará alguma fresta. Ainda que o combustível seja a "Valeriana" nossa de cada dia. rsrs
    Mas, principalmente, por termos um ao outro para, ainda que a "noite" insista, vencermos a escuridão.
    Beijo grande!

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  3. Teté,
    Corajoso e verdadeiro seu texto. Mas, a vida não é para ser assim. A sensibilidade sempre traz um pouco de melancolia, mas essa senhora negra é outra coisa, diferente do olhar profundo e sensível que os emotivos têm.. Acho que junta-se todos esses "lógicos" que vc falou, e, em alguns, constrói-se esse monstro. E a luta para matá-lo é árdua, porque lenta e instável, como vc mesmo fala. Da mesma forma que leva alguns anos se formando, pode levar outros tantos desfazendo-se. Mas, CORAGEM!!! E não desista de lutar, vc vencerá!!! Já é um bom começo saber e aceitar a existência dessa sombra, o primeiro importante passo para descartar-se dela.
    Abraço grande, amigo!!!
    Licínio

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